sexta-feira, 8 de abril de 2011

Cabeça no automático e coração desligado - Reportagem do massacre em escola de Realengo.

A notícia chegou ainda durante o programa do Clóvis Monteiro na redação da Tupi e eu estava em Duque de Caxias. Crianças feridas por tiros dentro de uma escola municipal em Realengo. Bala perdida? O diretor do colégio conseguiu ser localizado pela produção do Show da Manhã e adiantou que os disparos tinham sido feitos por um homem que entrara no colégio se passando por um palestrante e efetuara vários disparos... dessa vez a bala era achada, tinha alvo e direção certos: crianças, alunos da Escola Municipal Tasso da Silveira.
Começaria, então, a cobertura jornalística do caso mais bárbaro ocorrido no Brasil.
Eu, ainda em Caxias, onde faria uma entrevista com o comandante do batalhão, comecei a receber as primeiras informações. E com o carro em movimento, ia anotando frases, um tanto quanto desencontradas ainda, repassadas pela Ana Rodrigues. O trajeto da baixada fluminense até a zona oeste da cidade pareceu ainda mais distante. Ansiedade e nervosismo que me consumiam a cada semáforo fechado. Precisava chegar e começar a descrever tudo que visse, precisava começar o meu trabalho.
Celulares tocavam a todo momento. Nextel, aparelho da rádio e o iphone se perdiam no meu colo em meio a papéis e ao notebook, onde eu tentava buscar alguma atualização pela internet.
E, quando, finalmente, o GPS resolveu ajudar a encontrar a rua General Benjamim de Matos, vi a movimentação de policiais, bombeiros e centenas de pessoas que se aglomeravam atrás do cordão de isolamento.
Enquanto saía do carro, fui fazendo contato com a central técnica, era pra entrar no ar e dizer que eu estava ali, de frente pra notícia.
Dali em diante, eu tinha que buscar personagens, testemunhas, vítimas.
A polícia já estava toda mobilizada, desde militares até delegados da civil. Bombeiros se deslocavam a todo momento. E eu, caminhava de lá pra cá, tentando confirmar números de vítimas, que aumentavam a cada "flash".
O celular tocava, insistia... chefia, redação, rádios de São Paulo, Brasília, Porto Alegre, TV de Minas Gerais, todos pediam boletins. Isso sem falar naquelas ligações "sem noção", fora de hora. Não consegui parar pra pensar... a cabeça parecia funcionar automaticamente. E só ela funcionava mesmo, porque com o passar do tempo, a fome e a sede pareciam me fazer perder as forças... "nem pensar em parar pra fazer xixi."
Governador, prefeito, comandante da polícia militar e chefe da polícia civil estavam ali... iniciaram uma coletiva dentro da escola. Autoridades reunidas na quadra de esportes de uma escola municipal de Realengo... eles anunciariam a tragédia sem precedentes que acabara de acontecer na manhã daquele 7 de abril de 2011.
Depois da coletiva que trouxe detalhes, conhecidos hoje por todos nós, a movimentação de populares já era menor nos arredores, e eu pude sentar na calçada e respirar. Liguei pra minha mãe, porque havia chamadas não atendidas dela no meu celular.
E  quando ela atendeu, eu já fui relatando, ainda em tom de reportagem, como se passasse mais um flash... e minha mãe chorou... ela já estava aos prantos e eu nem tinha percebido. Meu coração estava desligado.
Eu não podia me abalar, faltava chegar na redação, escutar novamente todas as entrevistas, organizar os textos, as sonoras e gravar matérias para os programas da noite.
Depois de trabalhar mais de 12 horas, bati o ponto de saída.
Em casa, depois de um banho, chorei.

7 comentários:

  1. Ser reporter em uma hora dessa Bianca deve ser terrivel. Nao poder se emocionar, nao poder deixar transparecer emoção. Mais profissional é assim mesmo. Parabéns pela sua cobertura e pela cobertura da Tupi.

    Bjs

    Andreia Braga

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  2. Estava escutando o Clóvis, qdo vc entrou falando da noticia. Não imaginei que fosse tamanha tragédia! Se pra nós ouvintes foi terrível, imagino pra vc, ter que coordenar trabalho com emoção. É duro um Pai ou uma Mãe, perder seu filho que estava na hora certa no lugar certo !!!!!
    Lamentável...Boa noite....

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  3. Incrível a emoção e detalhamento do seu relato... me coloquei em seu lugar em alguns momentos. Definitivamente ser repórter por vezes não é tarefa nada fácil. É para vocacionados... parabéns pelo seu trabalho sóbrio e tão importante em meio a essa tamanha tragédia. O seu blog além de tudo é uma aula de jornalismo

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  4. Acompanhei pela Tupi FM, foi incrível o profissionalismo de todos, informação sem sensacionalismo. Complicado isso, entendo que quando já se é campeão de audiência, não há necessidade de se explorar ao extremo situações assim.

    Sobra é competência, e certamente você deu um show nesse quesito, ainda mais no dia do jornalista. Detalhou tudo certinho....

    E AINDA BEM QUE CONSEGUIU CHORAR!

    Hoje, só consigo chorar de felicidade.

    Importante o registro, para que esses momentos não sejam esquecidos, mas principalmente que nunca mais se repitam.

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  5. É Bianca,

    Nesta hora eu estava indo para o trabalho e dentro do táxi pois estava muito atrasado pedi ao motorista que saísse da Band e colocasse na Tupi. Neste momento começou a entrar você ao vivo. O motorista começou a chorar e eu emocionado também comecei a chorar pois embora sabendo do teu profissionalismo senti lá no fundo a tua emoção. Que trabalho difícil o seu amiga. Ontem na cobertura do enterro das crianças senti várias vezes a sua voz embargada. Que Allah te proteja Bianca e te de forças todos os dias para enfrentar esta dura rotina de trabalho. Umgrande beijo do seu amigo Suhail.

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  6. Incrível, quanta transparência, parece que vivemos isso com você! Parabéns pelo profissionalismo!! Não sei se nessas horas eu conseguiria deixar meu emocional um pouco de lado, você agiu com maestria.

    Concordo com o Glauber: "Definitivamente ser repórter por vezes não é tarefa nada fácil. É para vocacionados". =)

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  7. Aos amigos ouvintes, obrigada pela audiência e mensagens carinhosas de sempre. À amiga virtual Lara, espero que as histórias a incentivem na envolvente profissão. Glauber, sempre parceiro.
    Abraços!

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